O Estado brasileiro está te violando e você nem sabe!
A adoção da prescrição intercorrente no processo penal brasileiro viola o princípio da vedação à proteção ineficiente, pois compromete a capacidade do Estado de garantir a tutela efetiva dos bens jurídicos protegidos pelo direito penal, fragilizando a resposta estatal a crimes e promovendo a impunidade. 1. O direito penal como instrumento de proteção eficaz O direito penal tem como finalidade proteger bens jurídicos de relevância fundamental para a sociedade, como a vida, a liberdade e o patrimônio. A prescrição intercorrente, ao extinguir a punibilidade devido à paralisação processual por longos períodos, transfere para o cidadão as consequências da ineficiência estatal, transformando a morosidade processual em benefício ao acusado e ignorando os direitos das vítimas e da coletividade. Isso fere a obrigação do Estado de atuar como garantidor da segurança pública e da ordem jurídica. 2. A vedação à proteção ineficiente e os deveres do Estado O princípio da vedação à proteção ineficiente exige que o Estado adote medidas adequadas e suficientes para prevenir, punir e reprimir condutas criminosas. A prescrição intercorrente desestimula a apuração integral dos fatos, uma vez que premia a paralisação processual com a extinção da punibilidade. Assim, o Estado não cumpre seu papel de assegurar justiça para as vítimas nem oferece uma resposta proporcional às violações penais, comprometendo a confiança da sociedade na eficácia do sistema de justiça criminal. 3. Impacto na persecução penal e na prevenção do crime A possibilidade de prescrição intercorrente cria incentivos para a dilação processual, seja por manobras processuais das defesas, seja pela inércia das instituições responsáveis pela persecução penal. Isso reduz a efetividade do sistema punitivo e a capacidade de dissuasão do direito penal, gerando um ambiente permissivo à prática de crimes. Além disso, a banalização da extinção da punibilidade enfraquece o caráter preventivo do direito penal, comprometendo sua função social. 4. A colisão com princípios constitucionais fundamentais Embora o direito penal deva respeitar garantias como a presunção de inocência e o devido processo legal, a prescrição intercorrente não é um corolário necessário dessas proteções. A Constituição Federal impõe ao Estado o dever de garantir a segurança e a paz social, exigindo um equilíbrio entre os direitos do acusado e os direitos da vítima e da sociedade. Ao adotar a prescrição intercorrente, o sistema penal prioriza de forma desproporcional o direito do réu em detrimento da função repressiva e protetiva do direito penal, violando os princípios da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade. 5. A ausência de previsão legal específica O Código Penal brasileiro já estabelece prazos prescricionais específicos e as condições para a extinção da punibilidade. A prescrição intercorrente não possui previsão legal no âmbito do processo penal, sendo um instituto importado do direito processual civil, onde a lógica de proteção de bens jurídicos é distinta. Sua aplicação no processo penal seria uma criação jurisprudencial que extrapola os limites normativos, contrariando o princípio da legalidade e gerando insegurança jurídica. Conclusão A adoção da prescrição intercorrente no processo penal brasileiro viola o princípio da vedação à proteção ineficiente porque fragiliza a atuação do Estado na proteção dos bens jurídicos fundamentais, promove a impunidade e enfraquece a confiança da sociedade no sistema de justiça criminal. Além disso, tal instituto desrespeita o equilíbrio entre os direitos do acusado, das vítimas e da coletividade, comprometendo a função social do direito penal e contrariando princípios constitucionais como a proporcionalidade e a dignidade da pessoa humana. Portanto, a prescrição intercorrente não deve ser admitida no processo penal, sob pena de esvaziar a função essencial do direito penal como garantidor da ordem jurídica e da justiça.
11/21/20241 min read
Reflexões jurídicas atuais